sábado, 4 de maio de 2013

A coragem no quotidiano




“O heroísmo no quotidiano não consiste em denunciar ou ficar indignado, mas em enfrentar o insuportável, em dizer o inaceitável, em resistir às mil tentações dos pequenos atos de covardia pelos quais tantas vezes, contra a nossa vontade, por comodidade ou passividade, nos deixamos levar.”
Jacques Salomé



"Nenhum pessimista jamais descobriu os segredos das estrelas, ou navegou por mares desconhecidos, ou abriu uma nova porta ao espírito humano."
Helen Keller

“A tradição ocidental não deixa margens para dúvidas na ligação que faz entre sabedoria e pessimismo. Bastaria um daqueles inesquecíveis retratos de Rembrandt para nos dizer tudo: sábio é aquele que se senta na penumbra, olhando com ponderada distância para as ilusões de transparência que a luz e a existência acendem. O que não é propriamente algo que tenha mudado. Veja-se como mais facilmente o taciturno passa por sábio do que o homem alegre. E um espírito torturado e reticente arranca maior alcance e aplauso do que todos os que se esforçam por manter ativa a esperança.
Há, de facto, um erro de avaliação que leva a considerar a jovialidade do otimista como característica espontânea de caráter, que nada deve à decisão, à maturação da vontade ou à tenacidade. Aliás, o mais comum é arrumar o otimismo na ingénua estação dos verdes anos (mesmo se ele persiste fora de época) e reservar o fruto comprovado da argúcia apenas para o seu oposto. «Juventude ociosa/ por tudo iludida/ por delicadeza/ perdi minha vida» - é aviso de Rimbaud, garantem-nos. No pessimismo, pelo contrário, nada se perde, pois somos levados a adivinhar aí um coerente processo de consciência, uma abrangência de análise sobre todas as variantes, um metabolismo sagaz da pequena e da grande história.

Contudo, o que realmente experimentamos é o avesso desta experiência, já que o pessimismo é, em muitas circunstâncias, a resposta mais fácil às solicitações do tempo. Os que só vislumbram doses colossais de ciência e de humanidade no pessimismo, esquecem quanto ele pode ser conformista, parcial ou insensível. Certamente que o pessimismo desempenha uma função purgatória face às derivas, mas um mundo gerido por pessimistas talvez não nos levasse sequer a levantar âncora do porto. Importa sublinhar que otimismo não é fatalmente leviano ou infundado (e não deveria sê-lo nunca). Os otimistas autênticos não são os que desconhecem as razões que levam outros ao seu inverso, mas aqueles que dominando objetivamente o quadro do real mesmo assim o integram num projeto maior e paciente, onde os obstáculos podem constituir oportunidades.”
José Tolentino Mendonça



De facto parece persistir uma associação entre pessimismo e superioridade intelectual. Mas afinal onde está a sabedoria? Naquele que, taciturno, se refugia no pessimismo da razão limitando-se a criticar e queixar ou daquele que enfrenta as vicissitudes de cada dia lutando contra elas numa perspectiva de mudança? Uma mudança só possível num optimismo da vontade.
“Coragem é levantar da cama todo dia  mesmo sabendo que seria infinitamente melhor ficar ali, deitado.” (Renato Russo)
Sim, é preciso coragem para enfrentar as adversidades de cada dia, é preciso coragem para enfrentar o insuportável, é preciso coragem para resistir às mil tentações dos pequenos atos de covardia, é preciso coragem para sair da prisão da infelicidade… É justamente porque existe sempre a possibilidade da infelicidade que é necessário coragem e vontade para ser o mais feliz possível.



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