Ainda que pareça muito Ser ou Não Ser, tal como defendi em tempos numa peça de teatro que escrevi, a magia está em Ser e Não Ser. Somos sempre muitos e em muitos tempos e a tentação, para não nos perdermos e nos sentirmos minimamente equilibradas, é ir sendo uma coisa ou outra. Disparate. Podemos ser o tudo ou o nada, porque só dessa forma seremos o todo. Metades, partes, partículas, mais ou menos definidas. Adolescência, experiências, adultos, teorias. Afinal a multiplicidade existe. O desafio e, quem sabe a felicidade, está em ser uno na diversidade. Acima de tudo, deixarmo-nos ir sendo. Nada é apenas 8 ou 80. Nada é apenas branco ou preto. Há todo um universo de matizes e possibilidades. Experimentemos pois, sem medos e sem preconceitos ser o outro do outro que somos. E inventemos diálogos e discussões acesas e frutíferas, como a Primavera que está a chegar, para que tenhamos frutos pessoais e interpessoais porque a empatia nasce aí, nesse lugar onde, se nos colocarmos no lugar do outro, podemos ser tudo - como se fosse a primeira vez.
Alexandra
Metade - Oswaldo Montenegro
Que a força do medo que tenho
não me impeça de ver o que anseio
que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
porque metade de mim é o que eu grito
mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza.
que a mulher que amo seja pra sempre amada
mesmo que distante
porque metade de mim é partida
mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
apenas respeitadas como a única coisa
que resta a um homem inundado de sentimentos
porque metade de mim é o que ouço
mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço
e que essa tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada
porque metade de mim é o que penso
mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste
e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
que o espelho reflita em meu rosto num doce sorriso
que eu me lembro ter dado na infância
porque metade de mim é a lembrança do que fui
a outra metade não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
pra me fazer aquietar o espírito
e que o teu silêncio me fale cada vez mais
porque metade de mim é abrigo
mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
mesmo que ela não saiba
e que ninguém a tente complicar
porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
porque metade de mim é platéia
e a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada
porque metade de mim é amor
e a outra metade também.
Mensagem cheia de força Alexandra!
ResponderExcluirE não conhecia Oswaldo Montenegro, mas fiquei fã! Muito bom!!!
Obrigada! :-)
Olá Alexandra. " To be or not to be, is the question" Sempre ouvimo esta célebre frase. Depois de ler o que escreveste, chego à conclusão que afinal somos e não somos. Sempre foi assim...fomos muitas coisas e não fomos ...fizemos e não fizemos, pensámos e não pensámos. Ainda hoje é assim e num só dia vivemos essa diversidade toda; a cada instante sentimos e não sentimos, temos e não temos, sofremos e não sofremos. Somos individuos e essa individualidade faz-nos únicos em todo o universo, mas essa unicidade é cheia de diversidade, na realidade. Numa só pessoa, num só dia reunimos caracteriticas muito opostas. Interessante!O melhor mesmo é deixarmo-nos ir... sendo o que tiver que ser e não sendo o que não tiver que ser. Esta música já conhecia e adoro! Uma outra do Oswaldo Montenegro muito bonita e interessante é a Lista; fala dos amigos, dos que vão e dos que veem. Linda! Um beijinho, Alexandra e obrigada por esta reflexão. Amanhã será um novo dia do resto de minha vida e vou, com toda a certeza, em algum momento ver o sol brilhar e no instante seguinte vou ver o sol esconder. É assim a vida...somos assim nós também...uma coisa agora e outra logo de seguida.
ResponderExcluirBeijinhos e um bom fim de semana
Emília
descobri o que procurava mesmo debaixo das palavras deixadas e comentadas antes... porque não tinha visto com calma a sequência dos posts do blog...
ResponderExcluirconhecia o poema, mas nunca o tinha ouvido "cantado", nem conhecia a imagem de Montenegro...
Tocou-me tudo, bem fundo como a Teresa previra e me alertara para ver... e eu sem saber onde.
Tocaramme as palavras da Alexandra, tão ditas ao meu jeito de sentir e de me interrogar e de me angustiar também...
... a agora agradeço à Alexandra, ao optimismo em construção e, perdoem-me, directamente à Teresa que tão bem sabia o quanto estas palavras me diriam muito... e fundo... e que precisava delas...
Obrigada, obrigada...
com comoção
Sempre
Isabel